domingo, 16 de maio de 2010

Entrevista da FHM a um Sem-Abrigo - “Nobre Vagabundo”


Esta entrevista fala da vida de um sem abrigo, Marco Caravela de 30 anos que se encontra a dormir no Terreiro do Paço, em Lisboa.
Em apenas 35 perguntas, algumas bastantes banais outras deveras importantes e sobre as quais não fazemos ideia de qual será a resposta até as lermos e surpreendermo-nos.
Marco dorme mais precisamente em Alcântara debaixo de um viaduto, pois é um local protegido e onde está menos exposto ao frio, contudo tem que mudar de sítio, pois por esta altura faz imenso frio à noite nas ruas de Lisboa. Geralmente procura lugares quentes e abrigados, deste modo já dormiu nos antigos armazéns do Porto de Lisboa e no Saldanha. Considera ainda que os melhores sítios para passar as suas noites são perto no aeroporto por causa das condutas de ar quente e no Parque das Nações. Para suportar o frio de rachar do nosso país marco vive ao contrário das outras pessoas, de noite anda de um lado para o outro e dorme mais de dia, mesmo assim para se manter no mínimo quente usa várias camisolas, casacos e cobertores.
É através da instituição Comunidade Vida e Paz que consegue a maioria das suas refeições, todas as noites no Terreiro do paço estão a distribuir comida. Além disso tenta apanhar algum peixe com a sua cana de pesca.
Para ganhar algum dinheiro, marco arruma carros, pede esmolas e trabalha na vida nocturna como prostituto, no parque Eduardo VII. Trabalha nesta vida porque considera que só com esmolas não consegue sobreviver. O dinheiro que ganha gasta para beber café e comprar comida.
Apesar destes contras todos referidos acima, tem uma namorada também prostituta e conheceram-se no mesmo local onde ele trabalha à noite mas esta não é sem abrigo e tem a sua própria casa. Também já teve um relacionamento com uma mulher durante 3 anos, por oposição à actual, esta era sem abrigo mas acabou por abandoná-lo.
Este sem abrigo considera que as pessoas olham os sem abrigo muitas vezes de lado na rua e tratam-nos como drogados e como diz na entrevista “Uma pessoa não é má só porque não tem a barba feita ou porque não tem dentes” , o último facto deve-se porque ele é seropositivo há treze anos e ficou infectado através de relações sexuais. Não toma qualquer tipo de medicação porque considera-se bem e compara-se a uma gato de sete vidas, logo não tem medo da morte. Devido á sua doença recebe do estado um subsídio de €395 que diz enviar á sua filha de 3 anos que mora com a avó e por motivos de orgulho ele não se junta á sua família.
Marco toma banho todos os dias, nos balneários públicos de Alcântara mas tem muita dificuldade em arranjar roupa nova e por isso usa constantemente a mesma roupa durante vários dias.
Mantém uma boa relação com os outros sem abrigo mas com a Polícia nem por isso, relata que estes fazem muitas rusgas e nestas levam as poucas coisas que eles têm.
Com a crise este homem vez cada vez mais pessoas a viverem nas ruas de Lisboa e culpa os estrangeiros pela falta de emprego em Portugal. Ele próprio já tentou procurar trabalho mas é sempre rejeitado quer na hotelaria quer na construção civil, segundo marco nesta última dão prioridade aos estrangeiros. E não é pelo facto de ser sem abrigo que não arranja um trabalho mais digno.
A meio da entrevista marco conta porque motivo acabou por se tornar num sem abrigo. Isto deveu-se à perda do seu emprego, pesca do bacalhau, que fez com que perdesse a sua casa. Chegou a ser preso mas diz que foi injustamente, no entando a policia encontrou no carro que conduzia heroína e isto levou-o a passar cinco anos e meio na prisão.

Esta é apenas uma história de muitas das NOSSAS ruas de Lisboa. Uma cidade Linda de Dia e de Noite mas que esconde tantas caras como a de Marco.

Entrevista: José Mascarenhas

Postado por: Jéssica Ribeiro

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Pobreza em Portugal não pára de crescer

"Os portugueses continuam a empobrecer". A conclusão é da Assistência Médica Internacional de acordo com dados recolhidos no primeiro semestre do ano.

Assistência Médica Internacional (AMI) diz que há uma nítida tendência para um crescente número de casos de pobreza e que a grande maioria das pessoas que pede auxílio encontra-se em plena idade activa, entre os 21 e os 59 anos de idade.

A dois dias de se assinalar o Dia Internacional para Erradicação da Pobreza, a AMI refere que 5201 pessoas procuraram o apoio social da organização. "Mais 506 que em igual período de 2008 e um número que se aproxima perigosamente dos totais anuais de anos anteriores (em 2004, o número total foi de 5929)", refere. Em comparação com o primeiro semestre do ano anterior, verifica-se um aumento de cerca de 10%.

No primeiro semetre deste ano, quase duas mil pessoas recorreram pela primeira vez ao apoio social da AMI, "mais 24% que durante o mesmo período no ano anterior"

A maioria da população que recorreu aos centros Porta Amiga encontra-se em situação de desemprego (80%), tendo como principais recursos os subsídios e apoios institucionais e o apoio de familiares ou amigos.

Relativamente ao Rendimento Social de Inserção (RSI), verificou-se um aumento do número de beneficiários comparativamente ao mesmo período do ano passado.

Ainda segundo a AMI, o serviço que maior procura registou neste período de tempo foi o de distribuição de géneros alimentares, roupa e medicamentos.


Retirado de: jn.sapo.pt
Data: 15 de Outubro 2009

Postado por: Jéssica Ribeiro

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

À Procura da Felicidade - Filme

  • título original:The Pursuit of Happyness
  • género:Drama
  • duração:01 hs 57 min
  • ano de lançamento:2006
  • site oficial:http://www.aprocuradafelicidade.com.br
  • estúdio:Columbia Pictures Corporation / Relativity Media / Escape Artists / Overbrook Entertainment
  • distribuidora:Sony Pictures Entertainment / Columbia Pictures
  • direcção: Gabriele Muccino
  • roteiro:Steve Conrad
  • produção:Todd Black, Jason Blumenthal, James Lassiter, Will Smith, Steve Tisch e Teddy Zee
  • música:Andrea Guerra
  • fotografia:Phedon Papamichael
  • direção de arte:
  • figurino:Sharen Davis
  • edição:Hughes Winborne

Chris Gardner (Will Smith) é um pai de família que enfrenta sérios problemas financeiros. Apesar de todas as tentativas em manter a família unida, Linda (Thandie Newton), sua esposa, decide partir. Chris agora é pai solteiro e precisa cuidar de Christopher (Jaden Smith), seu filho de apenas 5 anos. Ele tenta usar a sua habilidade como vendedor para conseguir um emprego melhor, que lhe dê um salário mais digno. Chris consegue uma vaga de estagiário numa importante corretora de acções, mas não recebe salário pelos serviços prestados. Sua esperança é que, ao fim do programa de estágio, ele seja contratado e assim tenha um futuro promissor na empresa. Porém seus problemas financeiros não podem esperar que isto aconteça, o que faz com que sejam despejados. Chris e Christopher passam a dormir em abrigos, estações de comboio, banheiros e onde quer que consigam um refúgio à noite, mantendo a esperança de que dias melhores virão. 

 Retirado de: http://www.adorocinema.com
Postado e editado por: Jéssica Ribeiro 

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Perfil dos Sem-Abrigo das ruas de Lisboa

O perfil das ruas de Lisboa, elaborado com base no trabalho da Equipa de Rua da Santa Casa da Misericórdia a partir de entrevistas repetidas (Bento, Barreto, Pires, 1996):

- Sexo Masculino 
- Raça Branca
- Naturalidade e nacionalidade portuguesas
- Idade entre os 35 e os 60 anos
- Escolaridade mínima 
- SOlteiro
- Sem filhos
- Sem contactos com a família
- Pernoita no centro da cidade de Lisboa
- Utilização dps serviços da Santa Casa da Misericordia
- Passado institucional (educacional, psiquiátrico, prisional)
- Doenças Psiquiátricas (alcoolismo, psicoses, toxicodependência)
- Vitimização
- Mendicidade pouco frequente

Retirado: livro
Título: Sem- Amor Sem-Abrigo
Autor: António Bento e Elias Barreto
Editora: Climepsi Editores

Postado por: Jéssica Ribeiro

Ajudar o Haiti - UNICEF


"O Haiti é o país mais pobre do hemisfério ocidental e tem uma população de 9.6 milhões de habitantes, dos quais mais de metade têm menos de 21 anos. A UNICEF está presente no Haiti desde 1949 e trabalha directamente com o governo na criação de soluções de longo prazo para problemas causados pela pobreza e pela falta de cuidados de saúde básicos, educação e de serviços de saneamento. O país sofre de uma instabilidade política prolongada e de uma economia gravemente deprimida. Nos últimos anos, os efeitos da crise global de alimentos e particularmente as violentas estações de furacões deixaram o país extraordinariamente vulnerável. Esta catástrofe vai ainda exacerbar a já difícil situação da população do Haiti, sobretudo das mulheres e das crianças."

Como Ajudar? 

Nas Caixas Multibanco - Menu "Transferências", Seleccionar "Ser Solidário", Optar por "UNICEF"
(Para obter o comprovativo do donativo, válido para efeitos fiscais, seleccionar a opção "Factura" e introduzir
o Número de Contribuinte)


Por Cheque endereçado ao Comité Português para a UNICEF, Av. António Augusto de Aguiar, 56 - 3º Esq., 1069-115 Lisboa

Conta na Caixa Geral de Depósitos: NIB 0035 0097 0000 1996 1303

Retirado de: UNICEF.pt
Postado por: Jéssica Ribeiro

sábado, 21 de novembro de 2009

Campanha das mantas

O grupo Esquecidos da Sociedade, da escola Secundária Gama Barros -Cacém tem orgulho de apresentar a nossa Campanha de mantas!
Até Janeiro iremos angariar mantas/cobertores ou quem preferir dar um pequeno donativo que irá ser utilizado na compra de cobertores que irão ser entregues por nós com o apoio da instituição CASA aos Sem-Abrigo de Lisboa.


Para o seu coração quente ficar,
uma manta tem que doar!
Para entregar a sua doação contactar:
 esquecidos_sociedade@hotmail.com

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Os pobres existem! E estão em toda parte.



Metade da população mundial vive com menos de 2 dólares por dia!
Na sociedade globalizada em que vivemos, não se respeita de uma forma geral a dignidade de uma pessoa. Somos considerados como um comprador em potencial e valorizados por aquilo que podemos consumir e obviamente dar lucro.

Os pobres existem! E estão em toda parte. É preciso dar-se conta da existência deles. Nós estamos para os pobres, como os Romanos estavam para os Bárbaros. Eles empenhavam-se em construir muralhas e enviar exércitos para as fronteiras para vigiá-los; nós fazemos a mesma coisa mas de outros modos.
O que podemos fazer efetivamente de concreto pelos pobres pode resumir-se em três palavras: amá-los, tratá-los com dignidade e socorrê-los.
Os pobres não merecem apenas a nossa compaixão, mas também merecem a nossa admiração, pois eles vivenciam a humanidade em situações limite. Do mesmo modo que no rally se testa o automóvel em condições extremas, os pobres vão a fundo nas capacidades do ser humano.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Coração Sem Abrigo - livro



Autor: Letria, José Jorge

Um homem torna-se num sem-abrigo, renunciando a tudo o que em tempos o ligou a pessoas, a lugares, a objectos e a lembranças. Resta-lhe, como companhia, um cão Labrador de pêlo negro, que conseguiu salvar de um canil municipal onde estava prestes a ser abatido.

As deambulações dos dois companheiros pelas ruas da cidade são também uma viagem afectiva pela geografia dos excluídos, dos que um dia de si mesmos se exilaram, por cansaço, amargura ou revolta, sem se libertarem da memória.

Coração sem Abrigo é uma história de solidão mas também de amor partilhado, contada na primeira pessoa por um homem sem idade e sem nome, que pode identificar-se com outros que a sociedade condenou à exclusão. Uma história que também fala da liberdade tantas vezes amarga de quem, não tendo tecto nem afecto, só presta contas à sua própria consciência.

Depois de publicar na Oficina do Livro, entre outras, as obras Amados Cães, Amados Gatos, Meu Portugal Brasileiro e O que Darwin escreveu a Deus, José Jorge Letria constrói agora uma narrativa de intensa humanidade e envolvente carga poética, que retrata a vida de um sem-abrigo e do seu companheiro de todas as horas, um cão chamado Lobito.

Pode comprar aqui: WOOK


Fonte: wook.pt
Postado por: Jéssica Ribeiro

sábado, 7 de novembro de 2009

A voz dos sem-abrigo





Ele perdeu o seu trabalho, família e esperança. Vive nas ruas e, na internet, encontrou um sentido para a vida e um meio de luta


Kevin Barbieux acorda às 4h45, arruma a cama, veste-se e caminha até um Burger King no centro de Nashville, no Estado americano do Tennessee. Come ovos com bacon e toma uma Coca Light ao pequeno-almoço. Lê um pouco – adora o mestre da psicanálise Carl Jung –, conversa com os colegas, passa por um café, fala com algumas pessoas e olha para os jornais do dia. Então vai para a biblioteca pública, e lá fica até à hora em que fecha, dividido entre livros e um computador ligado à internet. Todos os dias ele actualiza o seu blog, um diário que pode ser lido por qualquer cidadão que navegue na rede: www.thehomelessguy.blospot.com. Seria uma rotina banal, não fosse Barbieux, de 41 anos, um sem-abrigo.
Ele mora nas ruas e abrigos há duas décadas. Casou, teve dois filhos, mas não conseguiu manter 'uma vida normal'. Barbieux desconfiou de Deus e perdeu a fé em si mesmo, mas foi salvo pelos livros e pela tecnologia. Agora usa o seu blog, que teve mais de 100 mil visitantes em menos de três meses, para 'legitimar os moradores da rua, pedir que sejam tratados como seres humanos, com compaixão, aceitação e assistência'.



ÉPOCA – Como foi parar à rua?
Kevin Barbieux – Em 1982, resolvi deixar a minha cidade, San Diego. Vim até onde o dinheiro deu, Nashville. Não consegui trabalho e passei a dormir no carro. Quando o frio ficou insuportável, procurei um dos abrigos da cidade para os sem-abrigo.
ÉPOCA – Muitas pessoas ficam sem dinheiro e não vão morar na rua. Por que você fez essa escolha?
Barbieux – Ninguém escolhe viver na rua. Para mim foi algo inevitável, porque tenho distúrbio de ansiedade e dificuldades de aprendizagem. Não possuo as condições necessárias para cuidar de mim mesmo e viver de forma independente.
ÉPOCA – Os seus pais não o ajudaram?
Barbieux – Eles têm tão pouco interesse quanto compreensão sobre a minha situação. Não são pessoas instruídas nem generosas. Ter sido criado por esse tipo de gente deve explicar parte do meu problema.

'A cultura hedonista dos Estados Unidos torna difícil uma pessoa como eu encontrar o seu lugar. É uma existência solitária. Não foi por isso que me tornei um sem-abrigo. Desenvolvi esta visão por causa da vida que levo.'

ÉPOCA –Já teve emprego?
Barbieux – Um dos últimos foi num misto de loja e restaurante. Havia tanta gente no ambiente que eu não conseguia sentir-me no controle, ficava muito nervoso e aí tinha ataques de ansiedade. Transpirava e ficava sem ar, não conseguia falar. E aí ficava mais nervoso.
ÉPOCA – Como foi o seu casamento?
Barbieux – Eu e minha ex nos conhecemos nas ruas, mas ela nunca foi sem-teto. Com ela consegui levar uma vida 'normal' por um tempo. Mas o amor não durou e eu voltei para a rua. Deixei as crianças com ela. Não queria que elas se sentissem divididas.
ÉPOCA – Como acha que os seus filhos lidam com a sua condição?
Barbieux – Eles não sabem de nada. A minha ex-mulher evita qualquer tipo de assunto delicado, e essa é uma das razões pelas quais nos separamos.
ÉPOCA – Como começou a fazer o blog?
Barbieux – Participo num fórum de discussão na internet sobre a cantora gospel Sarah Masen. Alguém mencionou os blogs e eu resolvi fazer o meu.
ÉPOCA – Com que objetivo?
Barbieux – Sempre fui lento a ler, mau na gramática. Eu considero-me inteligente, mas não pude desenvolver-me na rede pública de ensino. Então tomei para mim a tarefa de melhorar a minha compreensão do mundo e de superar as minhas limitações, tornar-me mais sociável. Tentei fazer um jornal para os sem-abrigo, que durou apenas dois números, o que despertou em mim o gosto pela escrita. Há alguns anos mantenho um diário pessoal. Numa instituição fiz um curso de um ano que me ajudou a ler melhor.

'Muita gente vê-me como uma grande ameaça, porque defendo os direitos de quem vive na rua e não tem acesso a nada. A minha simples existência contradiz a percepção de realidade dessas pessoas. ‘


ÉPOCA – O que é mais difícil de explicar?
Barbieux – As pessoas vêem o tema em preto e branco, mas há muitas nuances. Alguns acreditam que os sem-abrigo são quem moram na rua. Mas, se passar as noites numa, é lá a sua casa? E morar por favor? Eu, por exemplo, às vezes durmo em abrigos, mas, quando não encontro vaga ou chego depois do horário, fico nas ruas mesmo

Escrito por: Paula Mageste
Adaptado ao Português (Portugal) : Jéssica Ribeiro 
 


Reportagem Uma noite com os sem-abrigo

O cacau quente conforta o estômago e aquece o corpo, mas são as conversas, os desabafos escutados pacientemente pelos voluntários, que dão alento ao espírito. Ali todos se conhecem, e às quartas-feiras, quando passa a unidade móvel dos Médicos do Mundo, a Praça da Alegria, em Lisboa, sem tecto nem paredes, quase parece uma casa.

Os Médicos do Mundo criaram o projecto Noite Saudável em 2001 para ajudar uma população cujo número real ainda não é perfeitamente conhecido. Sabe-se que, em 2004, um estudo da câmara de Lisboa determinou existirem 931 sem-abrigo em Lisboa. Tanto que o Instituto da Segurança Social está a fazer o primeiro levantamento a nível nacional, cujos resultados devem ser divulgados em 2006.
Todas as quartas-feiras, das 20.00 às 24.00, a unidade móvel dos Médicos do Mundo estaciona a carrinha na Praça da Alegria. Naquela noite, a novidade é o cacau quente. E, tão ou mais importante que os cuidados de saúde prestados a cada um que ali se abeira, é a confiança que se estabelece e os sorrisos que se arrancam a quem nada tem. "Para nós não são os sem-abrigo... são o António, o José. Conhecemo-los e é importante que saibam que podem contar connosco", diz Paula Fernandes, responsável pelo projecto.
Cabe sempre mais um
O ambiente é familiar, todos se tratam pelo nome, como se fossem vizinhos desde sempre. Mas nem por isso os novos inquilinos são olhados com desconfiança ou postos de parte. "Se não puser problemas, qualquer um que venha é bem aceite. Por isso estamos cá todos", diz Pedro Nóbrega, que vive num banco da praça há mais de dez anos. É difícil saber com certeza o que o trouxe para a rua. As frases são confusas e sem muita ligação, intercaladas com momentos de um silêncio pesado. "Desorientei-me por causa de uma mulher e, por isso, estou com os camaradas. Mas tenho um filho de 16 anos e ainda hoje somos amigos".
Depois da separação começou a viajar. Foi imigrante em Espanha, França e Alemanha, países para onde ainda vai trabalhar de forma sazonal. "Lisboa é uma grande cidade, mas também muito pequenina para nós. Não chega para ganhar dinheiro". Mesmo assim, "nunca precisei de esmolas de ninguém", diz com orgulho. Ao filho, "nunca lhe faltou nada. Parte do que ganho é sempre para ele", diz. Nos intervalos deste vai e vem constante pela Europa, a rua é sempre o hotel escolhido. "Sempre que venho telefono à família para saber se está tudo bem. E depois fico por aqui, a curtir com eles", diz apontando na direcção dos bancos de jardim.
Fugir da solidão
Mas não são só os que vivem na rua que dão vida a esta praça. "São cada vez mais os idosos que encontramos à noite. Vivem sozinhos e esta é uma oportunidade de saírem do isolamento", diz Paula Fernandes. É o caso de Avelino Marques que todas as quartas-feiras vem à unidade móvel dos médicos do mundo para medir a tensão. Não é sem-abrigo, mas o dinheiro também não abunda - à reforma de 210 euros tira-lhe, todos os meses, 195 para pagar o quarto onde vive. Aos restantes 15 euros junta-lhes mais 100 que a Misericórdia lhe dá e assim vai vivendo. De segunda a sábado, faz as refeições numa das dependências da Santa Casa, na companhia de mais idosos em situação semelhante.
Um dia, há uns anos, teve que sair de casa para tratar da mãe, que adoecera. "A minha mulher não queria a minha mãe lá em casa, e eu tinha que tratar dela... tive que sair." Hoje vive sozinho. Há sete anos que não falava com a filha, contacto que reatou há pouco tempo. Em breve vai partir para a Alemanha, onde a filha é imigrante, e reencontrar o que lhe resta da família. Mas não por muito tempo. "Vou só por um mês, depois volto para cá. Estou é com medo da viagem de avião... e logo eu que andei tanto de avião!"
Assim que acaba de falar o rosto transfigura-se. Os olhos pequeninos brilham mais, o sorriso doce ganha a dimensão de um sonho, e as palavras saem em catadupa, naquele tom de voz de contador de histórias à volta da lareira. Um olhar mais atento e o pin em forma de bola de futebol na lapela do casaco verde denuncia-o. Marques foi jogador de futebol. "Do Sporting", diz com orgulho. "Era defesa esquerdo e chamavam-me o homem do lencinho por jogar sempre com um lencinho. Ganhei quatro campeonatos, duas taças de Portugal e uma Taça do Século".
Mais do que do presente, das dificuldades que tem ou não, é destes anos de glória que Marques gosta de falar. Ainda conheceu a equipa dos famosos cinco violinos - Vasques, Albano, Travassos, Peyroteo e Jesus Correia - que encantou por essa Europa fora. "Era com o Travassos que me dava melhor. Um dia estávamos no jardim do Campo Grande a jogar à bola e fomos presos - naquele tempo nem podíamos jogar à bola. Fomos para a esquadra do Campo Grande mas quem lá estava era o chefe Camilo, um grande sportinguista, que nos deixou sair logo." Podia estar horas a falar do tempo de futebolista e isso nota-se. Desfia cada memória ao pormenor, e o olhar perde-se na saudade. Hoje ainda vai ver todos os jogos a Alvalade, porque tem cartão vitalício, de acesso gratuito. "Mas já não é a mesma coisa", lamenta.
Viver os dois lados
Micola é voluntário dos Médicos do Mundo há dois anos. Veio da Ucrânia há cinco para fugir da pobreza. "A gente lá não sabe nada de Portugal, mas quando se abriram as fronteiras todo o mundo fugiu da pobreza o mais que pôde. E depois de Portugal já não há para onde fugir, é só oceano", diz meio a brincar meio a sério. Micola não tem mais de 30 anos. O rosto redondo, os olhos azuis e o sorriso permanente, dão-lhe um ar bonacheirão e bem disposto. No seu país natal trabalhava "para o governo, era assistente de deputado no Parlamento", aqui, quando chegou, veio trabalhar "de picareta e pá". Fugiu da miséria, mas a realidade que encontrou não foi bem a que sonhara - o patrão não lhe pagava e, em pouco tempo, estava sem emprego. "Nunca dormi na rua, mas cheguei a apanhar comida do lixo." E foi numa das noites em que tentava encontrar alguma coisa para comer que um estranho teve um gesto que Micola não esquece. "Era perto do Natal e vi alguém aproximar-se a dizer 'prenda, prenda'. No início tive medo, mas depois ele deu-me uma garrafa de vinho e um pouco de tudo o que se come no Natal." Ainda hoje, quando fala do assunto, os olhos muito azuis de Micola se comovem. "Não me conhecia. Viu-me da janela procurar comida no lixo e, só por bondade, veio ajudar-me."
O voluntariado apareceu meio por acaso na vida deste imigrante. "Eu estava na igreja e veio a enfermeira Fátima pedir-me ajuda para traduzir um estrangeiro que ela não percebia. Ela é uma senhora muito especial. Tem 63 anos, mas é muito enérgica, rápida, é uma enfermeira de guerra. É uma pessoa muito feliz e magnética... fiz-me voluntário quase de imediato". Agora conduz a unidade móvel dos Médicos do Mundo e ajuda nas traduções com os imigrantes de leste.
Hoje a realidade é outra, Micola já tem outro emprego, numa empresa de aspiração central e, por isso decidiu partilhar com os outros o que lhe sobra - tempo. "Trabalho das 6.00 às 24.00. Assim nem tenho que pensar no que fazer com o tempo livre. E ajudar é sempre bom", diz com uma gargalhada.

Fonte: Diário de Noticias
Redigido por:  Joana Rei
Em: 30 de Outubro de 2005

Postado por: Jéssica Ribeiro

Os Sem-Abrigo

 

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

"Ruas da Amargura"


O filme está em exibição nos seguintes locais:
- Almada Fórum -13h05 15h50 18h25 22h00 00h25
- Amoreiras - 13h10 15h40 18h20 21h10 23h40
-Dolce Vita Porto - 12h50 15h40 18h15 21h10 23h40